Em breve tudo se desacomodará

"Ao abordar relações familiares, românticas (ou opressivas?), de amizade e de sedução, mariam pessah demonstra como os laços interpessoais são, na mesma medida, capazes de destruir ou salvar uma pessoa. Eis aí mais um, entre tantos, gritos feministas da obra. Manuela não está sozinha, não é uma heroína autossuficiente que enfrenta o mundo, vence a guerra, aniquila o inimigo (como tantos homens sonhariam fazer). Ela busca andar acompanhada de iguais; busca, de fato, igualar-se àquelas mulheres que ela ama e admira. A transformação se dá no encontro, vem do coletivo para dentro e depois reverbera para fora, multiplicando os ventos de mudança. Os movimentos estão na personagem, na narradora e chegam nas leitoras. Até mesmo graficamente, o texto de mariam se move: às vezes cresce na página, às vezes se desestrutura. As palavras querem agir, atuar sobre o mundo do mesmo modo que atuam sobre o papel. Não basta dizer, é preciso chacoalhar. Gritar. Desacomodar. Desde seu livro Amor, placer, rabia y revolución, a autora aponta que não basta sentir raiva, é preciso também buscar caminhos de felicidade. Amor e prazer para sustentar a revolução. Em breve tudo se desacomodará investiga os trilhos que podem levar alguém de vítima à protagonista da própria vida. Quando Manuela consegue finalmente se libertar dos vínculos que a aprisionam ? os atuais e os do passado ? ela não se contenta com ser uma sobrevivente, pois Manuela quer muito mais que sobreviver, ela deseja encher-se de vida, de tesão e de propósito. Neste livro sobre encontrar chaves, abrir portas e inventar janelas de fuga, mariam pessah mostra que às vezes a melhor serventia que o passado pode ter é ser mesmo deixado para trás. Julia Dantas"